Guerra e Clima
Uma engrenagem que destrói o futuro.

Vivemos uma era em que as crises se entrelaçam de maneira quase indissociável. A crise climática já não é apenas uma questão de emissão de gases ou de aquecimento global: ela é social, política, humanitária — e, cada vez mais, militar. O mundo entra em combustão literal e simbólica.
Nas últimas semanas, a escalada de violência entre os Estados Unidos e o Irã — com os ataques norte-americanos a centros nucleares iranianos e a ameaça de retaliações em larga escala — reacendeu um temor antigo: o de um conflito regional se transformar em uma guerra de proporções globais. E se isso acontecer, as consequências ambientais serão catastróficas.
Guerras são aceleradoras do colapso ambiental. O aparato militar moderno é um dos maiores consumidores de combustíveis fósseis do planeta. Um caça em missão libera, em poucas horas, toneladas de CO₂ na atmosfera. Um porta-aviões movido a combustível fóssil consome mais energia em um dia do que pequenas cidades inteiras. Além disso, conflitos como o que se desenha no Oriente Médio costumam atingir diretamente refinarias, oleodutos, áreas industriais — gerando vazamentos, incêndios e contaminação em larga escala.
O Irã, com suas instalações nucleares em risco, torna o cenário ainda mais perigoso. Um ataque a um reator ou ao armazenamento de material radioativo pode gerar nuvens tóxicas, contaminação de solos e águas subterrâneas, além de impactos irreversíveis à saúde humana e ao equilíbrio ambiental de toda a região.
Mas o ciclo é perverso: o clima, cada vez mais instável, também alimenta a guerra. A escassez hídrica, a desertificação, a perda de terras férteis e os eventos extremos criam instabilidade social, deslocam populações, radicalizam discursos — e abrem caminho para o conflito armado. Quando o clima entra em colapso, a paz se torna um luxo raro.
Essa engrenagem — guerra e crise climática — gira sozinha. Um fator acelera o outro. A guerra destrói a possibilidade de uma ação climática coordenada e eficaz, enquanto o agravamento da crise climática torna o mundo mais inflamável, em todos os sentidos. O Oriente Médio, já sobrecarregado por temperaturas recordes, seca prolongada e escassez de recursos hídricos, pode ser o epicentro dessa catástrofe dupla.
Enquanto os líderes discutem alvos e estratégias, a atmosfera aquece, os oceanos sobem, as espécies desaparecem, e bilhões de pessoas ficam mais vulneráveis.
O planeta precisa de cooperação, não de coalizões armadas. De tratados de paz, não de tratados nucleares. De uma diplomacia climática séria, que reconheça que não haverá transição ecológica possível num mundo em guerra.
A guerra é uma fogueira de proporções cósmicas — e o clima, já à beira do colapso, não tem mais margem para ser combustível.
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💥 Dados recentes: o impacto ambiental dos conflitos armados
1. Pegada de carbono militar
• O Departamento de Defesa dos EUA emite cerca de 56 milhões de toneladas de CO₂ por ano, equivalente às emissões anuais de países inteiros como a Suécia ou o Peru.
• As forças armadas americanas emitiram aproximadamente 4 bilhões de toneladas de CO₂e entre 1979 e 2023.
• Estima-se que os militares em todo o mundo sejam responsáveis por cerca de 5,5% das emissões globais de gases de efeito estufa — mais que toda a aviação civil internacional.
2. Destruição ambiental direta
• Um par de bombardeiros B‑2 Spirit pode emitir cerca de 1.000 toneladas de CO₂ em uma única missão.
• Guerras frequentemente miram refinarias, oleodutos, usinas e indústrias químicas, causando incêndios tóxicos, derramamentos de petróleo, vazamentos de produtos químicos e poluição atmosférica massiva.
• A infraestrutura destruída leva anos — às vezes décadas — para ser limpa e restaurada, quando isso ocorre.
3. A escalada EUA–Irã e o risco nuclear
• Em junho de 2025, os EUA atacaram as instalações nucleares de Fordow, Natanz e Isfahan, no Irã. Embora não haja, até agora, indícios de radiação liberada, a ameaça de contaminação química é real.
• Um ataque direto ao reator de Bushehr, próximo ao Golfo Pérsico, colocaria em risco não só o Irã, mas todo o ecossistema do Golfo, com impactos transfronteiriços sobre o ar, o solo e as águas costeiras.
4. Retroalimentação entre guerra e crise climática
• Conflitos armados desviam recursos públicos de investimentos verdes, enfraquecem acordos climáticos e desestabilizam a governança internacional.
• Por outro lado, a própria crise climática — com secas severas, inundações, migrações forçadas e insegurança alimentar — já é motor de tensões geopolíticas, radicalização e guerra.
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🧭 Conclusão: paz climática é paz geopolítica
A escalada entre EUA e Irã escancara um fato brutal: os conflitos modernos são também conflitos ambientais. A guerra já não destrói apenas pessoas e cidades. Ela destrói o ar, a água, o solo, a possibilidade de um futuro habitável.
A humanidade está presa numa engrenagem onde a guerra alimenta o caos climático e o caos climático, por sua vez, alimenta a guerra. Romper esse ciclo exige coragem, diplomacia e compromisso internacional com a justiça climática — que só pode florescer em tempos de paz.
Não haverá futuro verde num mundo em chamas.
